Christiane Torloni - A Loba da Amazônia
novembro 11, 2009Christiane Torloni atua há mais de 35 anos e é uma referência na dramaturgia brasileira. Entre novelas, cinemas e teatros, é nas coxias que acalma a sua alma e se sente em casa. “Nasci praticamente no palco, foi sorte encontrarem tempo de correr e levar mamãe a maternidade na hora de eu nascer”, brinca no decorrer da entrevista dada a coletiva de jornalistas dispostos a saber tudo sobre o seu novo projeto teatral. Ela aparece à vontade vestida de calça jeans, tênis, discreta blusa preta, um colar dourado, linda e elegantíssima, em seus plenos 52 anos.
Em 40 minutos de entrevista, Christiane menciona várias vezes seus pais, os atores Monah Delacy e Geraldo Matheus, casados há 54 anos, com carinho e orgulho pelo universo artístico que proporcionaram a ela desde muito cedo, o que revela uma mulher que valoriza e respeita a família. Mãe do ator Leonardo Carvalho, casada com o diretor Ignácio Coqueiro, sente-se orgulhosa por caminhar dentro da cronologia teatral e amadurecer.
Ela é intensa, vai além do que as telas, câmeras ou palcos podem lhe proporcionar. Para ela é preciso ter coragem para sair da zona de conforto emocional vindo da maturidade, e necessário para avançar e superar medos. “Nos últimos dois anos fiz duas novelas, gravei o filme da história do Chico Xavier, participei de um concurso de dança, defendi um projeto ambiental em busca de prestígio social e preservação da Amazônia, e agora interpreto a Loba, um papel que exige um mergulho na maturidade” ,revela mostrando que sempre é possível mais.
“Não há uma divisão na formação de um indivíduo, ele é a soma de sua espiritualidade, profissão e existência pessoal”, afirma convicta. “Estou preocupadíssima com a apatia do povo brasileiro, as pessoas parecem viver a base de tarja preta (referindo-se a remédios controlados), tomam Rivotril com se fosse floral. O povo está se anestesiando, não querem se emocionar, chorar, acho até que nem estar alegre, porque pode dar rugas”, se posiciona enfaticamente, sem medo de cutucar aqueles que podem se ver no que ela está dizendo. Christiane aproveita a credibilidade e a visibilidade que conquistou ao longo da carreira profissional, e se engaja em questões políticas e sócio-ambientais.
Ela já tinha visitado a Amazônia em 1995, mas foi enquanto gravava a minissérie Amazônia, de Galvez a Chico Mendes (2007), que Christiane viu que algo precisava ser feito urgentemente. Por causa das gravações, ela viajou de Iapóca a Chui, cruzou o país inteiro, foi ao Acre, e interpretando uma personagem espanhola, o que lhe deu a chance de aprender sobre contextos históricos da nossa nação e ver uma realidade triste: desmatamento e devastação da floresta. Brotou ali o seu envolvimento e vontade de querer fazer algo pela preservação de um dos nossos maiores tesouros. Ao lado do ator e amigo, Victor Fasano, iniciaram uma campanha para chamar a atenção das autoridades e do povo da urgência em relação a preservação amazônica.
Não se trata de uma ONG e sim de um fundo, onde os atores se organizaram para conseguir o maior número possível de assinaturas que apoiassem a exigência para que seja cumprido o Parágrafo 4º, do Artigo 225 da Constituição Federal, que garante a preservação da Floresta Amazônica. Somado a isso, a iniciativa também visa despertar a consciência e o senso de cidadania nos brasileiros. Muita divulgação e uma carta em forma de poema, de autoria de Juca de Oliveira, colaboraram na sensibilização popular. Em quase dois anos de campanha, conseguiram 1.117.993 milhão assinaturas, que foi entregue pessoalmente, no dia 04 de junho deste ano, ao Presidente da República Lula Inácio da Silva. “Finalmente conseguimos representar a voz do povo e nos fazer ser ouvidos. Quanto mais falarmos nisso, mais despertaremos a consciência. Temos que buscar um discurso regular. A Floresta Tropical é o nosso maior ágil, o caminho para que as pessoas tenham educação ambiental e uma Amazônia em pé!”.
Ela que em tempos de caras pintadas se posicionou politicamente com muita convicção, hoje não se declara adepta a nenhum partido em particular. Mas não esconde a sua forte admiração pela candidata Marina Silva: “ela é uma mulher de coragem, com a saúde fragilizada pelas inúmeras malárias, se alfabetizou aos 15 anos, e fala como alguém formado em Harvard (respeitada Universidade inglesa), ela fala com o coração. Quando Senadora, ela já vinha trazendo estas questões ambientais ao plenário e atualmente será alguém que priorizará estes temas e as produções ‘verdes’". E mais uma vez Christiane deixa o recado e alfineta: “O que nós brasileiros não podemos de jeito nenhum é fechar os olhos para o passado dos candidatos políticos. A democracia nos excita e nos capacita através de assinaturas a impedir que sujeitos com fichas sujas possam vir a se candidatar. Como assim um ladrão ou um assassino candidato? Onde vamos parar?”.
Para a atriz, ela já vê macro a questão da preservação ambiental, entende que precisamos de ações grandiosas e urgentes para resultados efetivos, e que nós cidadãos precisamos nos organizar para isso. Quando pergunto de seus hábitos sustentáveis, ela me responde quase que ofendida, como se tivesse acabado de ouvir uma pergunta óbvia e ultrapassada: “Ora, é claro que faço, eu separo o lixo, fecho a torneira ao escovar os dentes, desligo o carro no trânsito,... Se não, é como se eu fizesse um discurso aqui e não vivesse o que falo. Não sou ‘ecochata’, mas faço a minha parte!”.
A peça é uma versão feminina do grande sucesso do autor Renato Borghi, encenado pela primeira vez, em 1987, com Raul Cortez como o lobo. Christiane Torloni também fazia parte do elenco há 22 anos, assim como o ator Leonardo Franco, na turnê da peça pelo Brasil. Mas agora, embora seja baseado no mesmo texto, o diretor José Possi Neto --que também dirigiu a montagem original--, garante que há muitas diferenças, já que Christiane, Leonardo, e até mesmo ele, já não são as mesmas pessoas. “Crescemos e amadurecemos como artistas e como seres humanos”, afirma Possi.
Após interpretarem uma irreverente relação de mãe e filha na novela global “Caminho das Índias", Christiane Torloni e Maria Maya agora são amantes. Tudo foi uma grande coincidência. Há dois anos, quando o elenco para a peça foi selecionado, a trama dos Cadores ainda não estava no ar. “Foi uma excelente oportunidade para avaliarmos se trabalharíamos bem juntas”, afirma Christiane. Quem completa o trio amoroso é o ator Leonardo Franco, que trás a tona situações convencionais e de bissexualidade.
Numa noite, um espetáculo de teatro é interrompido pela atriz principal, Júlia Ferraz (Christiane), que assume o clímax de sua crise existencial e afetiva diante do público. Escândalo. Revela-se o triângulo amoroso vivido por ela, envolvendo o ex-marido, Paulo Prado (Leonardo) e sua amante, Fernanda Porto (Maria), ambos atores da sua Companhia Teatral. A partir desta história, o público assiste a uma discussão sobre moral e relacionamento amoroso. Tudo em meio ao cotidiano dos camarins e coxias de um teatro. Trata-se de um desafio de interpretação para os três atores apaixonados pelo teatro.
Esta montagem foi produzida por Franco e Christiane, que consideram o texto uma jóia da dramaturgia nacional.
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