Em 'A loba de Ray-Ban', Christiane Torloni retoma peça da qual participou há mais de 20 anos, agora com o texto original
julho 20, 2010RIO - Quando Christiane Torloni, na próxima sexta-feira, entrar no palco do Teatro Carlos Gomes na primeira representação carioca da peça "A loba de Ray-Ban", ela não vai estar sozinha. Ao seu lado estarão Dina Sfat, Bibi Ferreira, Maria Della Costa, Cacilda Becker, Fernanda Montenegro e todas as mulheres que marcaram fortemente o teatro brasileiro das últimas décadas. Nas cerca das duas horas seguintes, quando ela estiver na pele de Júlia Ferraz, a consagrada atriz que é dona de uma companhia de teatro e que, numa só noite, sofre com a partida do ator que foi seu marido por dez anos e da atriz que namorava nos últimos tempos, o público vai identificar todas essas mulheres e outras mais, muitas das peças que marcaram as trajetórias dessas atrizes, muito do amor que esse tipo muito específico de ser humano, a atriz, sente pelo palco.
"A loba de Ray-Ban" é uma bela história de teatro. Mas a melhor história de teatro que ela carrega é contada nos seus bastidores e envolve seu autor, Renato Borghi, seu diretor, José Possi Neto, seu ator e produtor, Leonardo Franco, e, claro, sua atriz e produtora, Christiane Torloni. E revela como, numa experiência provavelmente inédita no teatro brasileiro, esses quatro artistas reuniram-se para retomar um texto que haviam montado mais de 20 anos atrás e mostrá-lo de forma completamente diferente.
- Antes, eu tinha escrito "A estrela Dalva", que foi muito mal aceita pela crítica - conta ele. - Cheguei a duvidar se eu era mesmo um autor. Resolvi, então, ler o texto para uma grande amiga.
A amiga era Dina Sfat, que, após a leitura, deu um conselho inusitado a Borghi: "Troca. E se o personagem principal, em vez de um ator, fosse uma atriz? Porque o teatro brasileiro é um matriarcado: Cacilda, Maria, Fernanda..."
Borghi acatou a ideia, e, em oito meses, transformou "O lobo..." em "A loba...". Paulo virou Júlia, Júlia virou Paulo e Fernando virou Fernanda. Mas essas não foram as principais modificações.
- Não se passa, automaticamente, de um universo masculino para um feminino. Eu sinto que é outra peça - analisa Renato Borghi.
"Ricardo III" transformou-se em "Medeia". O teste para a escolha de um novo integrante da companhia deixou de ser com o texto de "Eduardo II" e passou-se a usar "As criadas". Uma rápida cena de "Esperando Godot" (uma homenagem a Cacilda) foi mantida. Mas, principalmente, as difíceis relações que movem um explosivo triângulo amoroso teatral passaram a ser mostradas sob um ponto de vista feminino.
Quando a peça ficou pronta, Dina já estava muito doente (a atriz morreu em 1989) e não pôde montá-la. Borghi, então, voltou a mostrar "O lobo..." para atores. A peça acabou caindo nas mãos de Raul Cortez, que a montou com direção de José Possi Neto e Christiane Torloni como a ex-mulher.
- Foi um divisor de águas ma minha carreira - analisa agora Christiane. - Eu e Raul tínhamos tesão em cena. Havia uma tensão sexual no palco. Era muito quente. Foi um encontro de almas.
A peça estreou em São Paulo no finzinho de 1987, ganhou todos os prêmios daquele ano (para autor, diretor e ator) e ficou quatro anos em cartaz. Leonardo Franco entrou tarde no projeto. Quem estreou como Fernando, o jovem ator que quebra a harmonia entre Paulo e Júlia, foi Renato Modesto. Na temporada carioca, ele foi vivido por Tadeu Aguiar. Leonardo chegou quando a peça excursionou pelo Nordeste (e Christiane também foi substituída por Patrícia Pillar).
Leonardo Franco ficou pouco mais de um ano na peça. Foi pouco tempo, mas, graças a ele, a saga do Lobo/Loba continua viva.
- Estava em início de carreira e descobrindo o teatro que dá certo - conta ele. - Quando a temporada acabou, fiquei frustrado de não poder continuar o trabalho. Sentia que a minha história com a peça não tinha se completado.
==> Leia a crítica de 'A loba de Ray-Ban' no site do RioShow
Fonte : O Globo
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